79 - Dom João e Fausto
fotografias de Paulo Cintra e Laura Castro Caldas DOM JOÃO E FAUSTO de Christian Dietrich Grabbe Tradução João Barrento Encenação Christine Laurent Assistente de encenação Manuel Romano Cenário e figurinos Cristina Reis Assistentes para o cenário e guarda-roupa Linda Gomes Teixeira e Luís Miguel Santos Desenho de luzes Daniel Worm d'Assumpção Banda sonora Vasco Pimentel Coreografia de esgrima Eugénio Roque Director de montagem Jorge Esteves Construção e montagem de cenário João Paulo Araújo e Abel Fernando com Alexandre Araújo Construção de adereços Abel Fernando, João Paulo Araújo e Luís Miguel Santos Cabeleiras de estopa João Calvário Montagem de luzes Elias Macovela com João Paulo Araújo e Abel Fernando Operação de luzes Elias Macovela Instalação e operação de som Luís Lopes com Hugo Reis Guarda-roupa Emília Lima Costureiras Maria Barradas, Maria da Conceição Santos, Maria Helena Moreira, Maria de Lurdes Antunes e Maria do Sameiro Contra-regra Manuel Romano Cabelos Ana Ferreira Conservação do guarda-roupa Alice Madeira Cartaz Cristina Reis Secretária da Companhia Amália Barriga Interpretação (por ordem de entrada) D. João Ricardo Aibéo Leporello, criado de Dom João Luis Miguel Cintra Dona Ana Rita Loureiro Lisete, sua criada Sofia Marques O Governador Dom Gusmão, pai de Dona Ana Luís Lima Barreto Gaspar, criado do Governador Tónan Quito D. Octávio António Pedro Cerdeira Doutor Fausto José Airosa Um Cavaleiro Diogo Dória Signor Rubio, Chefe da Polícia Cândido Ferreira Signor Negro Luís Gaspar Um Padre Sofia Marques Gnomos Sofia Marques e Tónan Quito Lugar da acção Roma e o Monte Branco Música Igor Stravinsky: Shadow Dances - Stravinsky Miniatures (Orpheus Chamber Orchestra) Concerto in D para orquestra de cordas (Vivace; Arioso; Rondó) Concertino para 12 instrumentos; Scherzo à la Russe; Ragtime; Tango; Suite nº 2 para pequena orquestra (Valsa) Agradecemos à Cinemateca Portuguesa pela projecção especial do filme Fausto de Murnau. Colaboração de Joana Bruno Soares; Maria do Carmo Vasconcelos; Malhas Savior e Paulo Vieira Lisboa: Teatro do Bairro Alto. Estreia: 24/05/2001 28 representações Companhia subsidiada pela Secretaria de Estado da Cultura/IPAE, Instituto Português das Artes do Espectáculo Apoio RDP Antena 1 ESTE ESPECTÁCULO O Universo tem um sentido? Dom João e Fausto. Um dueto? Não, um quarteto, pois que estão acompanhados pelas suas fiéis sombras: Leporello, humaníssima encarnação, manhoso e supersticioso, e o cavaleiro-Mefistófeles, especialista em magia, mestre-escravo de Fausto aqui na terra. Os nossos quatro heróis entram no palco de Grabbe vestidos e armados com os atributos que adquiriram durante a sua longa travessia literária, enriquecida pelo teatro e pela música. Aqui não estão portanto já “em formação” como em Mozart ou em Goethe. Estão “feitos” da cabeça aos pés. Para fazer com que se encontrem, Grabbe utiliza o corte e a colagem. O objecto do seu desejo é uma Dona Ana reinventada, de uma beleza capaz de danar os santos. Os dois titãs são rivais também no amor e não só nos princípios. É portanto sob o signo do triângulo mimético que irão combater. Um deles com as armas do real, o outro com os poderes da magia. A invenção de os reunir e de construir a acção da peça a partir da perseguição da ideia fixa que têm em comum (possuir Dona Ana) e que se vê nascer em cada um deles, é uma inspiração de louco. De um louco genial e furioso que concebe uma partitura metafísica em que a ironia vem sabotar qualquer crença, e onde o sarcasmo liquida qualquer transcendência. Este duelo entre a sedução sem freio e o saber extraviado, o calor e o frio, o sul e o norte... trava-se, aos sacões, numa oposição entre um lirismo descabelado e um cortante cinismo. A linguagem para Grabbe é um campo imenso onde a melopeia de um monólogo não tem poder se não for contradita pela secura de uma palavra ou mesmo de uma sílaba. A mistura dos estilos, dos tons, das harmonias, é levada até à dissonância. Desta dissonância surge um desespero, fundamental no sentido em que só a partir deste desenlace pode surgir uma nova maneira de pensar o mundo. Esta peça é concebida como uma máquina de produzir “desassossego”. A energia vital e a força original são motores ainda mais poderosos que as palavras – os corpos são ideias – a acção é uma “fantasmagoria sobre fundo negro”. Dom João e Fausto vivem aqui a sua última aventura num ritmo infernal. O verdadeiro encontro, no sentido de uma troca em que o Outro existisse, será impossível. O mal-entendido sem fim. Quer um quer outro são mandados de volta para a sua solidão original. O Universo tem um sentido? Seja como for, segundo Christian Dietrich Grabbe, qualquer tentativa para lhe encontrar um, mesmo para além do Bem e do Mal, parece votada ao fracasso. A nós, se é verdade que, como diz Fitzgerald, “ devíamos compreender que as coisas não têm esperança, e mesmo assim estarmos decididos a mudá-las...”, resta-nos a arte, o riso e as lágrimas. Christine Laurent
|